quinta-feira, 6 de setembro de 2007

ZOTTOLO DIZ QUE RETIRA PHILIPS DO "CANSEI" SE HOUVER PARTIDARIZAÇÃO

Valor Econômico
REF: Comunicação Corporativa - Polêmica - Responsabilidade Social

por Maria Cristina Fernandes e Claudia Facchini


Zottolo é promovido pela matriz às vésperas do ato do Cansei:
"Seria um absurdo temer represália do governo"

"Experimenta colocar 'Paulo Zottolo' mais 'cansei' no Google. Nunca fui tão xingado na minha vida. As pessoas ofendem muito facilmente sem a menor base. Saem chutando. Tem sites que dizem que sou homossexual, outros que a Philips está querendo fazer como a ATT na derrubada do Allende, no Chile". Desde que publicou o anúncio de meia página em cinco jornais do país, ao custo de R$ 70 mil para a empresa, o presidente da Philips para a América Latina, Paulo Zottolo, caiu na boca do povo.

Eu não me lembro de um envolvimento político tão explícito de uma corporação quanto este. A Philips tem mais a perder que a ganhar numa ação como esta. Uma empresa multinacional de origem holandesa, adere a um movimento de oposição ao governo federal.
Pode-se considerar até louvável as motivações da Philips, porém o envolvimento como o próprio Zottolo admitiu foi "ingênuo". *Nota do Editor

"Já disseram que estou sendo mandado embora e que o presidente da República exigiu ao embaixador da Holanda minha cabeça". É rápido ao ser indagado se houve pressão. "Promoção", responde, sacando prontamente uma carta do integrante do conselho de administração da matriz, responsável pelas subsidiárias, Gottfried H. Dutiné, datada de 14 de agosto. Nela, a multinacional adiciona ao seu cargo o título de vice-presidente executivo da Royal Philips Electronics. A promoção não muda suas atribuições na empresa.

Antes da carta, a área de comunicação corporativa da multinacional, na Holanda, havia soltado o seguinte comunicado oficial: "A Royal Philips Electronics informa que suas subsidiárias têm autonomia para gerenciar e responder por eventos locais".

De capital fechado no Brasil, a empresa tem ações negociadas em bolsa na Holanda. Zottolo não vê conflito no interesse público da empresa com suas convicções privadas. Ele estará amanhã no ato que o movimento convocou para a praça da Sé, centro da cidade. Mas diz que, se o movimento for partidarizado - e ele acredita que acabará sendo - vai tirar a Philips da jogada, apesar de manter seu apoio pessoal à causa.

A Philips guarda uma extensa pauta de interesses a ser tratada com o governo federal. No dia seguinte ao acidente da TAM, o executivo tinha uma audiência marcada com a ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff. Na véspera, acamada por uma gripe forte, Dilma mandou cancelar a agenda do dia seguinte. "Tinha ficado para o dia 14 ou 15 (de agosto), mas não recebi mais notícias". Na audiência, Zottolo pretendia discutir com a ministra três pontos.

O primeiro item da agenda seria a instalação de uma nova fábrica da empresa no país para a produzir lâmpadas fluorescentes num amplo programa nacional de substituição das unidades incandescentes - um projeto que, avalia, poderia trazer uma economia de 30% no consumo de energia no país e evitar o anunciado apagão no setor.

O segundo era a fabricação do conversor para a captação do sinal digital de televisão: "O governo diz que vai custar R$ 150, mas, na verdade, não vai sair por menos de R$ 800 a R$ 1 mil".

O terceiro ponto da audiência com a ministra era a fabricação de um fogareiro que não emite fumaça e foi desenvolvido pela Philips na Índia para ser usado por famílias carentes que ainda cozinham com fogão a lenha. Ele levanta-se e tira da caixa o produto: "Era para mostrar à ministra. Agora ela não quer mais".

O produto seria mais uma demonstração do engajamento social da empresa: "Seria vendido por uns quatro ou cinco dólares. Não queríamos fazer isso para ganhar dinheiro".

Zottolo reconhece que a recusa do governo brasileiro em adotar o padrão europeu de TV digital desgastou a relação com a Philips - "Mas isso é uma página virada". O engajamento da empresa no 'Cansei' iniciou um novo capítulo da relação da Philips com o governo. Ao movimento, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva respondeu com o não-há-quem-ponha-mais gente-na-rua-do-que-eu.


Compara a adesão ao 'Cansei' a outros movimentos civis nos quais a Philips já se engajou, como o voto consciente e os programas que buscam atrair o setor privado a investir na educação pública. Mas reconhece que o momento em que o 'Cansei' foi lançado - quando Lula era tido como o culpado número 1 do acidente da TAM - facilitou a apropriação política do movimento. "Qualquer ação para ter impacto parte do coração. Você pede alguém em casamento no auge da paixão. Não tinha como lançar um movimento desses no dia seguinte à conquista do pentacampeonato da Copa do Mundo pelo Brasil".

O presidente da Philips está agora preocupado em preservar sua liberdade de opinião e em despartidarizar o movimento: "Eu cansei, na verdade, dos partidos de oposição. Se tenho oito milhões de razões para estar contra o PT, tenho outras dez milhões contra o PSDB. É um partido que não se entende. A oposição é ridícula, destrutiva. Cada um fala o que quer e o partido age como um bloqueador de projetos no Congresso Nacional. É um absurdo que a reforma tributária não saia porque os governadores não querem. Não podemos nos conformar em ficar crescendo 4,5% ao ano e distribuindo o Bolsa Família. O Brasil quer mais. E precisamos de reformas para isso".

Na carta que enviou ontem a amigos, convocando para o ato da praça da Sé, reconhece que o engajamento da Philips é inédito. "Alguns empresários me dizem: 'Paulo, você é muito corajoso. Admiro sua coragem de se expor desse jeito'. Mas coragem de quê? Se expor a quê? O que queremos é reposicionar o papel das empresas no debate nacional".

O executivo diz que não se arrependerá do seu engajamento mesmo se a audiência com a ministra não for remarcada. E diz não temer represálias. "Seria um absurdo temer represália do governo por iniciativas que a empresa tomou apenas querendo ajudar o país. O que é que o governo pode fazer? Devassa fiscal, me dizem. Mas nem as empresas podem ter medo de devassa nem o governo pode usar isso como instrumento de pressão".

No cargo há quatro meses, depois de uma carreira na Nivea marcada pela ênfase nas estratégias de marketing, Zottolo chegou à Philips com o desafio de alavancar a marca da empresa seguindo as mesmas diretrizes mundiais do grupo. Líder em televisores no Brasil, a Philips vem enfrentando uma concorrência cada vez mais acirrada das coreanas LG e Samsung.

Zottolo não teme que a empresa fique marcada pelo anti-lulismo: "É uma noção do papel das empresas que está sendo colocada pela primeira vez no Brasil. A noção predominante na década de 1970, de explorar o proletariado para dar lucro ao capitalista não vale mais. A nova geração tem responsabilidade social. E a Philips, que está há 83 anos no Brasil, não pode ser acusada de querer mal ao país".

Ainda que não se contabilizem adesões de seus pares ao movimento, Zottolo tem a convicção de que está fazendo escola no país.


Postado por Fernando Araújo
Formando do Curso de Adminstração com Marketing da Faculdade Castro Alves

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